Moça linda bem tratada.
Moça linda bem tratada,
Três séculos de família,
Burra como uma porta:
Um amor.
Grã-fino do despudor,
Esporte, ignorância e sexo,
Burro como uma porta:
Um coió*.
Mulher gordaça, filó,
De ouro por todos os poros
Burra como uma porta:
Paciência...
Plutocrata sem consciência
Nada porta, terremoto
Que porta de pobre arromba:
Uma bomba.
(* coió significa tolo, bobo, bocó. Quer dizer, na primeira estrofe, a moça, por mais que seja também "burra como uma porta", é bonita e bem tratada, portanto: "Um amor" - ironicamente, talvez. Já o "grã-fino do despudor", além de burro é coió, que dá no mesmo. E assim vamos).
Eu sou trezentos...
Eu sou trezentos, sou trezentos-e-cinquenta,
As sensações renascem de si mesmas sem repouso,
Ôh espelhos, ôh Pireneus! ôh caiçaras!
Si um deus morrer, irei no Piauí buscar outro!
Abraço no meu leito as milhores palavras,
E os suspiros que dou são violinos alheios;
Eu piso a terra como quem descobre a furto
Nas esquinas, nos táxis, nas camarinhas seus próprios beijos!
Eu sou trezentos, sou trezentos-e-cinquenta,
Mas um dia afinal eu toparei comigo...
Tenhamos paciência, andorinhas curtas,
Só o esquecimento é que condensa,
E então minha alma servirá de abrigo.
(Mário de Andrade)
Nenhum comentário:
Postar um comentário